#Em “Notas sobre a desconstrução do Popular ” o teórico cultural Stuart Hall simplifica e afirma que a cultura popular
consiste em todas essas coisas que o povo faz ou fez.#
Como já
definiu o professor e escritor Jack Siqueira a “encomendação das almas” já foi tradição,
como ainda o é em muitas regiões do interior de Minas Gerais.Segundo o mesmo, durante a Quaresma, à meia noite de cada dia,
alguns homens , cobertos de branco até a cabeça se reuniam na porta da Igreja e
de lá saíam em direção ao cemitério rezando e entoando cânticos religiosos ao
som da matraca...
Aqui em Três Corações,
deparei-me a encomendação das almas, ou
melhor, mais conhecida por estes cantos como Procissão das Almas, anos atrás. Havia ouvido falar e finalmente
tive a oportunidade de participar através de referências e conhecidos.A
procissão pede, se possível, uma vestimenta branca, os rezadores vão na frente
com uma cruz e ao som cansado da matraca.A mulher principal usa também um véu
branco na face. Os outros acompanhantes vão atrás. Saem três vezes por semana,
e cada dia percorrem um bairro. Reza a tradição que não se deve olhar para
trás, correndo o risco de deparar com as almas encomendadas no cemitério na quarta-feira de cinzas e somente entregues
na sexta-feira da paixão após dias de cânticos e orações em suas intenções.
Ainda segundo a tradição os números de casas participantes por bairros devem
ser ímpares. Algumas casas oferecem o cafezinho após a reza, já deixam a mesa
posta, afinal, dizem os conhecedores do assunto , não devem sair de casa sem
devida permissão dos oradores. É assim que participei da solenidade .
Solenidade em oração, cantos lamuriosos e respeito aos antepassados e linda
como manifestação da cultura popular.
Mas vamos sair
da introdução... Como Minas é encantada por causos, não poderia deixar de
relatar aqui dois fatos que presenciei e que aconteceram na citada procissão:
Primeiro -quarta-feira de cinzas, segundo ano que participei da procissão. Fui
com os rezadores “encomendar” as almas no portão do Cemitério municipal.
Vestida a caráter, com uma peça branca,acompanhei o evento pelas ruas do Bairro
Boa Ventura. Tudo ocorreu bem na primeira casa, a oração com os tristes cantos
foram proclamados e partimos para a segunda casa. Tudo ia bem, eu com meu olhar
observador acompanhando a tudo e participando das ave-marias e pai-nossos,
quando de repente vi um movimento estranho. Uma senhora sentada, e com a
aparência estranha-outrora estava participando da reza de bom grado, e agora
ali, sentada- . Pensei que estava passando mal. Mas nada, uma entidade havia
tomado o corpo da pobre senhora, e com uma voz de além, clamava por luz.Fiquei
assustada, afinal nunca havia visto tal manifestação, Entre rezas e com o
crucifixo em punho e os rezadores rezando
e pedindo a penosa alma que subisse, o corpo havia finalmente retornado à dona.
Segundo: Bairro Triângulo, a
procissão havia orado em minha casa, obviamente do lado de fora. Servimos o
tradicional cafezinho aos participantes, tudo ocorreu bem e a procissão seguiu
para a terceira casa após o agradecimento pelo cafezinho e quitutes. Todos novamente com as vestimentas
adequadas.Paramos em frente a fatal casa. A matraca dá o alarme, os rezadores
seguem com os cânticos para introduzir as orações. Quando uma senhora grita do
lado de dentro, assustada e chorosa. Explico aqui a situação...Quem havia
recomendado a procissão fora uma senhora que morava ao fundo da casa da
referente assustada. A porta principal da casa do fundo dava para o lado de
fora, mas antes tínhamos que atravessar um corredor. Acontece que paramos em
frente à porta da casa principal, pensando que a procissão seria ali,afinal
ambas mulheres eram parentes ; mas a senhora da casa do fundo esqueceu de comunicar
à mulher da frente, e paramos na porta errada, resultando no rolo todo, que depois
foi esclarecido não antes de trêmulos goles de água para acalmar a assustada senhora . Confusão
essa que me rendeu a crônica e no final das contas, um causo que participei.
Gostaria muito
de contar mais causos sobre o ato solene em lembrança às almas, eu ia até
acompanhar na atual Quaresma pelo menos
um dia, em memória e por gostar da cultura popular,mas infelizmente fiquei sabendo que a
procissão encerrou-se este ano, por falta de membros.
imagem: google
4 comentários:
AMIGA, EMBORA TENHA TODO O RESPEITO E CRENÇA PELO QUE FOI AQUI RELATADO - PARTICIPEI ALGUMAS VEZES NA JUVENTUDE - NÃO PUDE DEIXAR DE DAR MUITAS RISADAS DO JEITO QUE VOCÊ CONTOU. A COISA É SÉRIA, MAS A MULHER DO TRIÂNGULO ASSUSTADA FOI ÓTIMO AMEI... KKKKKKKKKKKKKKK
MIL BEIJOS.
Que bom... meu objetivo foi falar da tradição cultural, o respeito pela procissão, e afinal um pouquinho de humor para incrementar.E olha que tudo aconteceu de verdade hein João!!
Nise! querida!Esses ''causos''são fantásticos!!Obrigada por nos relatar de forma brilhante essas manisfestaçoes populares da cultura mineira que afinal é de todos nós brasileiros dever conhecê-las.Amei e também a ilustração é bem interessante.Parabéns mais uma vez pela postagem.E que venham, mais causos!!
Obrigada eu Soninha,por sua sensível pessoa me ler! E quanto aos causos Minas tem muito a me inspirar, e que venham muito mais!!!Beijos!!
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