Mas hoje em dia tudo é muito diferente...


Se existem hábitos saudáveis, diga-se de passagem,aos quais as pessoas tendem a cumprir, uma que me aborrece por demais é ir ao dentista. Mas pasmem, ainda deixei um dinheirinho para cumprir este dolorido ritual, coitado dos que esperam meses por uma vaga no sistema de saúde. Porém, mesmo não esperando por uma vaga no SUS, me agoniza ter que esperar algumas horinhas para ser atendida. , mais ainda do que o torturante motorzinho. Detesto esperar, assim como a espera pelo médico, na fila do banco entre outros. Pois bem, retomo aqui a sala do dentista. Hora marcada para às 10:00 da manhã. Como boa mineira com medo de perder o trem, já fico de prontidão no consultório às 09:45.

Como sei que é demorado, levo sempre comigo um bom amigo: o livro. Estou eu lendo meu livrinho. Tento me concentrar, há muitos pacientes. A televisão ligada. De vez em quando paro minha leitura, observo ao redor, o local, as pessoas, realmente, como é chato esperar! Volto ao meu livro, quando noto um senhor que chega. Ele cumprimenta um homem,que deve ter por volta de uns 50 anos, sentado no banco almofadado de espera.Parecem velhos conhecidos que não se veem há tempos. Meu faro de cronista alerta: vai ter conversa boa.

Tento, mesmo assim, ler o livro, que nesta altura já está pela metade, mas não adianta, os ouvidos estão pregados na conversa entre os dois homens,- o que chegou, um senhorzinho de 71 anos( que fiquei sabendo ao revelar a idade para o outro),que pelos trajes parece ser um antigo proprietário de terras.Esses fazendeiros bem à moda antiga.

(...)__Mas quantos anos o senhor está mesmo?

__Ah, já estou velho, 71, meu fio.

__Mas não parece...Também, o pessoal da geração do senhor tá mais vivo do que nós.

__ Ahh, mas isso é porque antigamente nóis comia melhor. Lembro que quando moço, acordava cas galinhas,tomava um café com rapadura, pão com gordura de porco...

__ É mesmo né??E os toucinhos de antigamente pareciam mais puros, davam verdadeiros torresmos bonitos.

Fecho definitivamente o livro, devo admitir, a conversa me daria esta crônica que agora vos escrevo. Disfarçadamente, presto ainda mais atenção naquela prosa.

__Sinto saudades de quando o caminhão partia cum as latas de leite para entregá na cidade. Ainda tenho arguns fregueses, mas são tão poucos, que nem precisa mais do caminhão...

__ O senhor ainda tem aquele carro de boi?

__Tenho o carro lá, um tisouro conservado, mas o boi memo..

__ Uma pena. E aquele seu Zé Tonho, que tinha uma rocinha lá pros lados do senhor? Lembro dele quando criança, adorava contar um causo, depois nunca mais o vi.

__ Tadinho, nem me fale, era migão do meu pai, morreu do coração faz uns dois anos, mudou lá pros lados de São Bento, mas sempre a gente tinha contato, morreu véinho, espertinho que só...

E foram contando fatos, pessoas,o passado que nunca morre...E assim viajei um pouco na história dos dois.Já não estava impaciente pela demora do dentista, me chamou atenção do suposto fazendeiro, com sua fala caipira ( e linda),entusiasmado com o diálogo.

A conversa parecia que ia longe, logo depois, infelizmente fui atendida. Reflito: hoje os leites são em caixinhas, algumas pessoa nem sabe o que é o verdadeiro e delicioso torresmo,e já não se tem tempo para os amigos...fecho com a frase que o senhor falou: “ Bão tempos aqueles”.