Dentro do processo feminino, o lobo mau remete a questão edípica, surgindo o desejo inconsciente da menina de ser seduzida pelo pai. Se o pai é companheiro de sua mãe, como então ela livra-se da culpa? Surge nesse instante o papel da avó sendo ela agora responsável pela neta. A proteção excessiva em relação à menina, porém não ajudará a menina a resolver seus conflitos. Criasse de repente um jogo ricamente trabalhando em significado. O lobo aparece na figura da vovó. O lobo mau engole a boa avó. O paradoxo entre proteção e ameaça. Porém, o lobo, o desejo desaparecerá e a, velhinha voltará. Chapeuzinho se redime também da culpa em relação à mamãe a atração foi inconsciente e o resultado foi a aprendizagem. “SE NÃO HOUVESSE ALGO EM NÓS QUE APRECIA O LOBO MAU, ELE NÃO TERIA PODER SOBRE NÓS”. (BETTELHEIM, PAG 208-209, 1980).
Essa luta de impulsos em fazer as coisas certas e entrar em crise inconsciente é o que tece todo ocultismo feminino, tornando a personagem uma das mais queridas do mundo dos contos de fadas. A sutileza da sexualidade que nunca é mencionada merecendo uma interpretação mais refinada é a magia existente e apaixonante de Chapeuzinho Vermelho. A beleza da cor vermelha, voltando à sexualidade; o feminino é totalmente presente nesse conto.A capa vermelha a cor da paixão, o caminho da sexualidade, O ritual de iniciação presente na antiguidade, a menina pronta a virar mulher através da cor vermelha da menstruação. Enquanto isso, a avó descansa, ela está velha e não consegue abrir a porta, fato que representa a transferência da sexualidade através de gerações. “DEIXE-ME SOZINHA, VÁ TER COM A VOVÓ QUE É UMA MULHER MADURA, ELA SERÁ CAPAZ DE LIDAR COM O QUE VOCÊ REPRESENTA, EU NÃO SOU”. (BETTELHEIM, PÁG 210, 1980). De frente com o lobo Chapeuzinho toma conhecimento dos quatros sentidos, que irão orientá-la instintivamente pela puberdade. Segundo Fromm, o lobo pode ser comparado ao tempo, Chronos, e foi responsável por destruir a criança e despertar a mulher existente em chapeuzinho. O desabrochar da libido a partir do vermelho, a menstruação, assim ela agora é defrontada pelo problema do sexo.
No final de Chapeuzinho Vermelho surge a figura do caçador que sendo um personagem que aparece num só momento oportuno, foi o salvador da história. O bom pai isenta de aspectos sedutores. O elo da afetividade o equilíbrio familiar. Chapeuzinho pode retornar para casa. É melhor segui os conselhos da mãe, ver primeiramente como comporta o mundo adulto para poder se reintegrar a ele. Surge aí a importância do superego, que juntamente ao id e ego poderão orientar Chapeuzinho nos embates da vida. É o retorno a casa, o caminho foi de aprendizagem, resultado em conhecimento no interior.
Chapeuzinho Vermelho entrou num duelo oferecido pelo lobo. Ele jogou a carta inicial na narrativa quando convenceu a menina a sair do caminho. O texto contido de vozes feminina no começo parece ser superficial, mas vai se tornando interessante no desenrolar da trama como jogo de palavras, que no meio de perguntas e respostas dão o final do enredo. E todo esse esquema feito dentro de uma simbologia sem erros. É o grande jogo da vida. Concordo com Mariza Mendes em busca dos contos perdidos ao afirmar que Chapeuzinho é o texto mais curto, e ao mesmo tempo, o mais denso em impacto emocional. O feminino ali presente contradiz a um masculino universal a que estamos acostumados. A simples menininha aparentemente frágil consegue superar o lobo, mesmo sendo com a ajuda do caçador ela se sobressai no final da história. A força masculina do lobo foi derrotada pelo feminino. No mundo ainda machista em que vivemos Chapeuzinho deve sempre ser lembrada como uma heroína e sua imagem mantidas como uma personagem especial nos contos de fadas; uma menina. Mulher que ousou desafiar o caminho, e superando os obstáculos conseguiu se sobressair.
Hoje, encontramos diversas paráfrases da historinha de Chapeuzinho Vermelho. Cada autor a seu modo foi transferindo através dos tempos sua versão acrescentando ou modificando pequenos fatos, gerando transformações. Muitos contradizem as posições do outro, a respeito de Chapeuzinho, cada um é claro, defendendo sua posição. Mas o que interessa para nós é a força feminina, os textos ao serem reescritos e recontados contêm em si o feminino. A mãe, a avó e a doce criança ameaçadas pelo lobo com certeza permanecerão na imaginação das crianças, jovens e adultos, que num mundo agitado ainda devem encontrar um tempinho para a fantasia, tornando assim a realidade mais amena.
É preciso esclarecer que o protótipo do lobo é interessante à história por ele ser um devorador da natureza, um elemento conhecido dentro da vida dos camponeses da França do século XVIII. Hoje nossa sociedade é repleta de lobos que não cessam de degradar a força feminina, representada aqui pelos mais fracos. O que aguça alguns deles é o dinheiro, o poder. São capazes de fazes uma verdadeira carnificina pelo que querem. Existem ainda os lobos que seduzem pela conversa, coitada das moças que ainda caem na artimanha instintiva desses animais “(...) EMBORA TENHAM OS LENHADORES EXTERMINADO O LOBO NO CURSO DOS ÚLTIMOS DEZ MIL ANOS, NADA TENHA PERDIDO O LOBO DO SEU TERROR PRIMITIVO”.
Todo conto de fada nos traz uma mensagem que implicitamente ou não nos faz refletir sobre determinados aspectos da vida, principalmente nos aspectos psicológicos.
“MUITOS ADULTOS HOJE EM DIA TENDEM A TOMAR LITERALMENTE O QUE É DITO NOS CONTOS DE FADAS, QUANDO ESTES DEVERIAM SER ENCARADOS COMO RELATOS SIMBÓLICOS DE EXPERIÊNCIAS DE VIDA CRUCIAIS. (BETTELHEIM, PSICANÁLISE DOS CONTOS DE FADAS, PAG 215, 1980)”.
Chapeuzinho nos alerta que todos somos capazes de uma vida sublime, se dominadas as forças instintivas. Fugir dos problemas é a solução errada. Temos de concordar que se ela não tivesse saído do caminho, não teria o conhecimento de mundo com todos os seus perigos. Saber dosar os impulsos é a chave certa para o nosso equilíbrio, afinal um pouco de rebeldia é necessária.
Nos contos temos a oportunidade de sonhar com um mundo encantado. Quando se narra um conto e se fala o “Era uma vez...” a criança se transporta para um tempo especial, onde elementos aparecem para ajudar o herói. No caso de Chapeuzinho quem aparece para ajudar é um bom caçador. Isso nos leva a refletir que sempre há em nosso caminho pessoas, oportunidades que nos farão crescer sempre mais com o apoio que recebermos. No final das contas, sempre haverá uma mãe uma avó a quem retornar.