Não sabia que título dar ao meu livro, fato este que vinha me perseguindo alineatoriamente. Mas uma hora surgiria o milagre na minha miserável cabeça de aspirante à escritora. Pois um dia aconteceu, enfim, a dádiva do nome do meu sucinto livro.
Voltava do centro de Três Corações, “vinha da cidade”, como dizem os mineiros que não moram no centro e sim em bairros arredores. Caminhava com meus pensamentos, em passos exíguos.Ensimesmada, me consumia pensamentos fugazes, que a classe dos bípedes humanos costumam ter.Frases em monólogo comigo: o que falar na reunião amanhã,(como boa virginiana que se preze, tenho a angustiante ansiedade desnecessária). Contas a pagar e outros detalhes peculiares n a maioria das pessoas que se dizem dignas e honram seus compromissos. Que piegas!
Perto de casa, então, ouvi o ensaio das pastorinhas, que andam de porta em porta, para saudar o menino Jesus, durante os dias 24 de Dezembro a 06 de Janeiro:
Pastorinha do Deserto,
venha cá saudar Maria,
que encheu o céu de glória
e os corações de alegria...
Alevanta pastorinhas
Vamos todas alevantar
Pra saudar menino Deus
Deitadinho no altar...
Adeuzinho até a volta
Até o ano que vem...
A melodia, a letra simples e sacra, saída dos lábios angelicais, me trazendo paz. Pronto!Eis a revelação, meu momento de epifania, lembro-me do que diz Affonso Romano de Sant`anna, em seu texto: Uma simples epifania, onde acontece o “explicável inexplicável”. Uma resposta para o título do meu livro, do nada! Ei-la: Riquezas do Interior. O que vou explicar aqui: Em frações de segundos, penso: as pessoas não teem tempo pra prestar atenção nas coisas simples e puras. O canto das Pastorinhas, manifestação religiosa que não existe nas grandes capitais. Docemente me vem ainda lembrança da Folia de Reis, o terço dançado de São Gonçalo, onde segundo o costume, não pode rir dos cantadores nem da reza, senão o altar pega fogo, a Folia do Divino Espírito Santo, o batuque mágico do Congado, que ouvi a primeira vez em São Gonçalo do Sapucaí, em noites geladas do mês de Maio... O canto das pastorinhas, terno e eterno.
Pois bem, nesse transe, faço na minha incansável mente um paralelo; riquezas do interior, o que na verdade trata de situações cotidianas que acontecem geralmente em cidades do interior, e traço uma linha com os sentimentos, que, de alguma forma mexem com meu interior, valores essenciais, como a amizade, a doçura das crianças, e com confiança, valores que mexem subjetivamente com aqueles que estão me lendo. Uma ambigüidade poética! Riquezas do interior. Sinto-me plena por ser sensível ao ponto de me comover com o canto das Pastorinhas, me recolho, sou imodestamente rica, valorizo as coisas simples da vida. Amo Deus, as pessoas, os pássaros. Amo a cultura e costumes interioranos. E, é sobre isto que trato em meu livro, da maneira simples como sou e da simplicidade do povo mineiro.
A riqueza da “Bola de meia, bola de gude”, a riqueza da “pedra no caminho”, do Velho Chico, da Maria Fumaça, do menino Fernando Sabino, da cultura homérica das cidadezinhas e um brinde a minha bela Gerais, do povo do Mar de Minas. Obrigada Deus, pelas riquezas que dinheiro nenhum paga.

Retirado do livro: Riquezas do Interior.